31 de mar. de 2009

Transantúltimas vontades


A meus filhos — para que as
cumpram, ou não, e as façam
(ou não) cumprir.

Meninos, tomem sentido:
amanhã já não me acordem.
— É isso, pai, um pedido?...
— Não, amores: é uma ordem.

Vou morrer menino e moço,
sem pátria nem parentela,
com esta cruz ao pescoço
e a coroa real na lapela.

Pretendo um inteiro olvido.
Não quero que me recordem.
— É isso, pai, um pedido?...
— Não, amores: é uma ordem.

Rodrigo Emílio

Para a menina de seu pai


Para a menina de seu pai,
Trint’anos depois...

A minha filha primeira
nasceu após o Natal.
Esta lágrima... Esta olheira...
datam do seu funeral.

Tinha um perfil tão perfeito
— de filigrana franzina,
essa menina-de-peito
que me morreu, em menina...!

F’lipinha não se esvai...
Faz hoje anos. Trinta anos!
Veio convidar o pai
para a festa ser de ambos...


Rodrigo Emílio

Rodrigo Emílio



Rodrigo Emílio de Alarcão Ribeiro de Mello nasceu em Lisboa a 18 de Fevereiro de 1944, um mês depois de perder a avó paterna, que não chegou a conhecer. Perdeu o pai a 27 de Setembro de 1952, quando ainda não tinha dez anos, que lhe causa um vazio infindável.



Em 1953, sofre um novo desgosto com a morte do avô paterno. Estudou no Colégio João de Deus,no Liceu Camões e cursou Filologia Românica, curso que o obrigou a passar um ano em Coimbra.



Os seus primeiros versos datam da infância e juventude e são editados em diversas publicações. Em 1963 sai a lume na separata da revista Ocidente a novela-quase-poema Rasgões no Sonho, que teve também a versão portuguesa do texto poético da opereta com música de Schubert Canção de Amor, que subiu à cena em Lisboa no Teatro da Trindade e inaugurou o programa da temporada lírica do mesmo ano.



Ainda em 1963, é premiado no Concurso de Manuscritos do S.N.I. como autor do original As Lágrimas Ancoradas à Sombra do Amor, que em 1965 publica em livro.



Sonhador e romântico como todo o poeta verdadeiro, ofereceu rimas e versos, entoou trovas e serenatas, cantou e encantou a terra dos avós paternos que tanto amava.



Casou-se com Maria Ester em Abril de 1967 na capela da sua casa de São José em Parada de Gonta e tiveram quatro filhos. Em plena lua de mel por terras de Serém, é informado por uma pessoa da família que deverá apresentar-se em Mafra nesse mesmo mês para o serviço militar.



O mês de Janeiro de 1968 marca o nascimento do seu primeiro filho, Rodrigo Victor, nome que era também de seu pai, avô do recém-nascido. Seis meses depois de terminada a recruta em Mafra, embarca com a família para Moçambique onde vai cumprir a comissão militar. Durante dois anos, presta serviço como alferes miliciano no Corpo Expedicionário.



Em 1969 vai a Lisboa de licença, ocasião em que recebe o premio dos Jogos Florais da Emissora Nacional na modalidade de Poesia Lírica com que tinha sido contemplado.



Nos últimos meses de 1970 regressa definitivamente a Portugal à mídia portuguesa, onde aliás já prestava serviço, e inicia a produção das rubricas de poesia ‘Vestiram-se os Poetas de Soldados’ e ‘Sobre a Terra e Sobre o Mar’ exibidas em 1971 e 1972, respectivamente. Ao mesmo tempo, colabora assiduamente com a Verbo Editora nos sectores cultural e educativo.



A 27 de Dezembro de 1971 nasce-lhe a primeira filha, a quem dá o nome de Filipa Catarina, mas a 11 de Janeiro, quando ainda mal despontava para a vida, a pequena Filipa Catarina abandona este mundo depois de uma agonia atroz e lancinante que o mergulha num luto interminável.



Em 1972, dedica à filha morta uma elegia de grande beleza poética, Poemas Acenados a Uma Criança Longe, que, mais que nenhuma, talvez, exprime num estilo incomparável a dor de uma perda sem remédio, a tristeza sem cura de uma saudade para sempre.



Em 1973, é editada a antologia de poetas portugueses ‘Vestiram-se os Poetas de Soldados — Canto da Pátria em Guerra’ em homenagem aos combatentes da guerra do Ultramar, antologia organizada por Rodrigo Emílio.



Ainda em 1973, dá à estampa mais dois livros, Primeira Colheita e A Segunda Cegueira, a que se segue um terceiro, Serenata a meus Umbrais, súmula de textos em prosa e em verso de grande beleza plástica.



A 17 de Julho do mesmo ano nasce-lhe outro filho, Gonçalo Tomás, o terceiro da família.



Perseguido pelo regime da época, Rodrigo Emílio viu-se forçado a tomar o caminho do exílio e partiu com a família para Madrid, onde a 18 de Março de 1975 veio ao mundo Constança Filipa, a segunda filha e última nascida.



Um dia, sempre acompanhado da mulher e dos filhos, deixa a Espanha que o tinha acolhido, cruza o céu do Atlântico e voa para o Canadá a alimentar uma esperança, mas em breve é torturado pela lonjura que o aflige e separa de tudo… e segue para o Brasil, onde sucede o mesmo, a mesma inquietação, a mesma ansiedade, a mesma nostalgia. As notícias que espera chegam tarde, é longe… e regressa a Madrid com o filho Gonçalo. A mulher e os outros filhos ficam no Rio de Janeiro para que o Rodrigo Victor não perca a primeira classe da escola. Mais tarde e de novo, estão todos reunidos em Madrid. É então que decide regressar a Lisboa.



Havia que refazer um pouco a vida, procurar um ponto de apoio menos incerto e mais seguro, e entra ao serviço da Rádio Renascença. Os filhos ingressam no Colégio Manuel Bernardes.



Na década de 80 vai viver para Viseu onde leciona durante três anos em escolas oficiais, mas não faz parte do seu caráter submeter-se a horários programados, a regras frias e imprecisas, a intrigas escolares, a proibições caprichosas e sem justificação… e decide dar explicações em sua própria casa. Entretanto, deixa Viseu cada fim de semana e retira-se na Casa de S. José em Parada de Gonta onde continua solitariamente, muitas vezes dias a fio e noites adentro, a sua magnífica e inspirada obra literária e poética. Onde recebe também os amigos e camaradas que o visitam e com quem partilha longas tertúlias... sempre fiel ao inseparável Português Suave e à chávena de café.



A 24 de Janeiro de 1996 recebe a notícia de que é avô. O primeiro neto chama-se Rodrigo como ele próprio e é o iniciador da quarta geração. Dois anos mais tarde, a 8 de Dezembro, nasce o segundo neto, Tiago.



Os últimos tempos em Parada de Gonta fizeram-no conhecer dias difíceis e penosos, horas cruéis que teriam derrubado uma alma menos sã ou menos preparada. Não obstante a existência discreta e pacata que levava entre pilhas de papéis e montanhas de livros, não poucas vezes se via alvo da inveja, da mesquinhês, do dito torpe e malévolo e, frequentemente, da baixeza de “gente feita à pressa com pressa de ser gente”, como ele mesmo dizia muito acertadamente...



E voltou de novo para Lisboa, não apenas porque sentia que chegava aos limites do que devia suportar, mas porque queria estar perto dos que continuavam a merecer a sua estima e que, na verdade, não o abandonaram. Depois, era o convívio literário e poético, o reencontro com velhos amigos, a partilha de ideias e gostos idênticos, a comunhão recordações, o culto do amor à Pátria... que um dia foi.



Era um farol resplandecente na noite negra e tormentosa, um carbúnculo brilhante nesta era de espanto assombrada pelo pio lúgubre do pássaro da morte... Era ele com os pés na terra e os olhos no céu, uma mão na caneta e outra na espada, o porte nobre e fidalgo do poeta-guerreiro para quem a honra se chama fidelidade.



Rodrigo Emílio tinha de pagar o tributo final... para chegar à última clarificação, talvez, que é o mais certo. Assim, foi-se deixando morrer, mas aos poucos, devagar, como o Rei-menino de Alcácer Quibir. Havia que matar saudades e quis voltar aos seus mortos e se foi em 28 de março de 2004.



OBRAS



As lágrimas ancoradas à sombra do amor (1963)

Mote para motim (1971)

Paralelo 26 s às audições do ìndico (1971)

Poemas acenados a uma criança longe (1972)

A segunda cegueira (1973)

Primeira colheita (1973)

Serenata a meus umbrais (1976)

Reunião de ruínas (1978)

Poemas de braço ao alto (1982)



Fonte: Comunidade Biografia e Poesia Portuguesa



MARIPOSAS COMPANHEIRAS



Seguimos a mesma rota,
Feito pássaros alados
Borboleteando o espaço,
Almejando o topo do mundo.

Somos mariposas companheiras
Buscando a claridade!
Somos as nossas verdades
Tentando ascender o porvir,
Na construção de nós mesmos,
Para depois seguir.

Genaura Tormin

30 de mar. de 2009

A brisa da existência

Paisagem de Cedro - CE, do álbum de Edson Reis
Há anos e anos, o poeta
e debruça em seu ofício
de servir ao mundo.

Não é leve o fardo.
Bem sabe, porém,
dos prazeres que há
em cerzir palavras no vento.

Um dia – justiça seja feita –
lhe darão o prêmio maior
e a civilização se curvará
ao brandir de suas linhas.

Se tal sorte não alcançar,
bastará que lhe digam:
és o poeta de teu país.

Já poderá morrer.
Mas se nem isto lhe for dado
gozar, que lhe deem o título,
fugaz, de grande poeta.

Não seja isto, porém, razão
de morrer ou viver.
Por que buscar mais
do que ser, simplesmente,
o poeta de sua cidade?!

De nem tanto precisa.
Se alguém, com quem cruzar,
lhe gritar ao ouvido:
oh, você, o meu poeta,

já terá valido a pena
haver-se dado à sina
de ouvir dentro de si
a brisa da existência.


Alcides Buss

Poema da noite

Imagem: Cedro - Ce. Foto do álbum de Edson Reis

O que falta dizer
depois do adeus?

A alma, qual roseira
no deserto, reconhece
a algema de sal
que prende o algoz
a si próprio.

Um resíduo de luz
assinala um desejo,
a flâmula dum erro,
um frêmito
nas cordas vocais.

Eu, tu, nós:
rumamos para onde menos dói
estar na esteira dos fatos.

Se pudéssemos, lentamente
deixaríamos tudo como era
e lembraríamos as coisas
como quem adormece.

Alcides Buss

ALCIDES BUSS


Alcides Buss Nasceu na localidade de Ribeirão Grande, atual município de Salete, no Alto Vale do Itajaí, em 1948.. É diretor da Editora da Universidade Federal de Santa Catarina, e desde 1980, professor de Teoria Literária na mesma instituição. Iniciou sua carreira literária com o livro Círculo Quadrado, em 1970. Depois disto publicou mais dezenove obras, sendo uma delas um estudo sobre Cobra Nonato, do modernista Raul Bopp.

Durante a década de 70, atuando como diretor de cultura da Prefeitura de Joinville/SC promoveu um trabalho de resgate da cultura popular e de popularização das artes em geral, que ficou conhecido em todo o Brasil. Concertos, recitais eruditos e espetáculo de dança passaram a ser levados a lugares tais como praças públicas, escolas e igrejas. Exposições artísticas circulavam, de forma itinerante, nos bairros da cidade. E a literatura, especialmente a poesia, foi às ruas através de varais literários.

São marcos da época de Joinville a criação da, hoje tradicional, Feira de Arte e Artesanato, a implantação do Museu de Arte, a realização de concursos de jardins nas residências e fábricas, e a instalação da Escola de Dança, semente do que se transformou no maior festival de dança da América Latina.

Em 1980, transferindo-se para Florianópolis, Alcides Buss criou na UFSC uma das primeiras oficinas literárias do Brasil. Durante anos, as oficinas promoveram a renovação literária, abrindo espaço também para o desenvolvimento de outras artes, como o cinema. Através delas, os varais literários se intensificaram e foram alcançando, aos poucos, outras cidades e estados brasileiros.

Eleito em 1993 presidente da Associação Brasileira das Editoras Universitárias, para um mandato de dois anos, empenhou-se no fortalecimento da instituição, garantindo a participação das edições universitárias em todos os eventos nacionais e internacionais mais importantes. Seu objetivo maior, no entanto, foi a formação de uma rede nacional para distribuição e comercialização das edições acadêmicas, que abrange atualmente mais de cem livrarias.

Com o livro Pessoa que finge a dor, lançou em 1985 o Movimento de Ação do Livro. Através dele, parte de uma tiragem é destinada à circulação livre e popular. De mão em mão, o livro procura o seu leitor, podendo chegar a expressivo número de pessoas, nos mais distantes lugares.

Alcides Buss presidiu a União Brasileira de Escritores de Santa Catarina no período de 1997-1999. Foi finalista do Prêmio Jabuti 2000 com o livro Cinza de Fênix e três elegias (Editora Insular, 1999). Em 2000 publicou o livro infantil Pomar de Palavras, pela editora Cuca Fresca e, em 2002, pela Editora da UFSC, o livro Contemplação do amor – 30 anos de poesia escolhida.

O livro A Poesia do ABC foi publicado inicialmente pela Editora Mercado Aberto, de Porto Alegre. Teve várias edições e recebeu o prêmio da APCA – Associação Paulista de Críticas de Arte. Foi adotado pelo programa Salas de Leitura do MEC. Atualmente há uma nova edição pela Editora Cuca Fresca. Além de diretor da Editora da UFSC, Alcides Buss é Diretor de Comunicação da Associação Brasileira de Editoras Universitárias.

OBRAS

• Círculo quadrado, Joinville, edição do autor, 1970
• O bolso ou a vida?, Florianópolis, DCE/UFSC, 1971
• Ahsim, Florianópolis, editora Lunardelli, 1976
• O homem e a mulher, Joinville, edição do autor, 1980
• Cobra Norato e a especificidade da linguagem poética, Florianópolis, FCC, 1982
• O homem sem o homem, Florianópolis, editora Noa Noa, 1982
• Antologia do varal literário (Org.), Florianópolis, Editora da UFSC, 1983
• Sete pavios no ar, Florianópolis, Edições Sanfona, 1985
• Pessoa que finge a dor, Florianópolis, Movimento de Ação do Livro, 1985
• Segunda pessoa, Florianópolis, Movimento de Ação do Livro, 1987
• Transação, Florianópolis, M.A.L. Edições, 1988
• A poesia do ABC (infantil), Porto Alegre, editora Mercado Aberto, 1989
• O professor é um poeta (Org.). Florianópolis, Editora da UFSC, 1989
• Contemplação do amor – vinte anos de poesia escolhida, Florianópolis, Editora da UFSC, 1991
• Natural, afetivo, frágil, Florianópolis, Edições Athanor, 1992
• Nenhum milagre, Florianópolis, editora Letras Contemporâneas, 1993
• Sinais/Sentidos, Florianópolis, M.A.L. Edições, 1995
• Cinza de Fênix e três elegias, Florianópolis, editora Insular, 1999
• Pomar de palavras (infantil), Florianópolis, Cuca Fresca Edições, 2000
• Contemplação do amor – trinta anos de poesia escolhida. Florianópolis, Editora da UFSC, 2002
• Cadernos da Noite, M.A.L. Edições, 2004


PREMIAÇÕES

* 1º lugar no I Festival Catarinense de Poesia Universitária – DCE-UFSC, 1971
* Prêmio Magister – Sindicato dos Professores de Santa Catarina, 1985
* Prêmio APCA – Associação Paulista de Críticos de Arte, 1989
* Medalha Caio Prado Júnior – UBE-RJ, 1994
* Medalha Manuel Bandeira – UBE-RJ, 1996
* Mérito Livreiro Odilon Lunardelli, 1998
* Mérito Cultural Cruz e Sousa, 2001
* Prêmio Ruth Laus - UBE-RJ, 2008

Fonte: Confraria Poética II do ORKUT

29 de mar. de 2009

O Sono de Um Anjo

Imagem: Jevan Siqueira

Quando ela dorme, como dorme a estrela
Nos vapores da tímida alvorada,
E a sua doce fronte extasiada,
Mais perfeita que um lírio, e tão singela,

Tão serena, tão lúcida, tão bela,
Como dos anjos a cabeça amada,
Repousa na cambraia perfumada,
Eu velo absorto o casto sono dela.

E rogo a Deus, enquanto a estrela brilha,
Deus que protege a planta e a flor obscura,
E nos indica do futuro a trilha,

Deus, por quem toda a criação se humilha,
Que tenha pena dessa criatura,
Desse botão de flor — que é minha filha

Luís Guimarães Júnior

PAISAGEM

Imgem: Jevan Siqueira

O dia frouxo e lânguido declina
Da Ave-Maria às doces badaladas;
Em surdo enxame as auras perfumadas
Sobem do vale e descem da colina.

A juriti saudosa o colo inclina
Gemendo entre as paineiras afastadas;
E além nas pardas serras elevadas
Vê-se da Lua a curva purpurina.

O rebanho e os pastores caminhando
Por entre as altas matas, lentamente,
Voltam do pasto num tranqüilo bando;

Suspira o rio tépido e plangente,
E pelo rio as vozes afinando,
As lavadeiras cantam tristemente


Luís Guimarães Júnior
Sonetos e rimas (1880)

LUÍS GUIMARÃES JÚNIOR



Luís Caetano Guimarães Júnior, diplomata, poeta, romancista e teatrólogo, nasceu no Rio de Janeiro, RJ, em 17 de fevereiro de 1845, e faleceu em Lisboa, Portugal, em 20 de maio de 1898. Foi um dos dez membros eleitos para se completar o quadro de fundadores da Academia Brasileira de Letras, onde criou a Cadeira n. 31, que tem como patrono o poeta Pedro Luís.

Era filho de Luís Caetano Pereira Guimarães, português, e de Albina de Moura, brasileira. (Há uma divergência na data de seu nascimento: Sílvio Romero indica o ano de 44; outras fontes registram 1847. A filha do poeta, D. Iracema Guimarães Vilela, forneceu a Múcio Leão a data de 45.) Fez os primeiros estudos no Rio de Janeiro. Aos dezesseis anos escreveu o romance Lírio branco, dedicado a Machado de Assis. Partiu para São Paulo, a fim de continuar os estudos preparatórios, e lá recebeu uma carta de Machado de Assis animando-o a prosseguir na carreira das letras. Fez o curso de Direito no Recife entre 1864 e 1869.

Ali assistiu ao desenvolvimento da "escola condoreira", em que tomou parte mais ou menos diretamente. Continuou a escrever, multiplicando-se no jornalismo e escrevendo livros de contos, comédias e poesias. Aos 28 anos, apaixonado por Cecília Canongia, cogitou de se casar. Sua situação no jornalismo e nas letras, embora brilhante, não lhe proporcionava os meios para viver estavelmente. O poeta e amigo Pedro Luís, então ministro dos Negócios Estrangeiros, oferece-lhe um lugar na diplomacia como secretário de Legação em Londres. De 1873 a 1894, passou por vários outros postos, em Santiago do Chile, em Roma, onde serviu sob as ordens de Gonçalves de Magalhães, e em Lisboa; foi, depois, como enviado extraordinário, para Veneza. Em 1894, transferiu-se, já aposentado, para Lisboa, onde veio a falecer.

Em Lisboa, como secretário de Legação, teve ocasião de conhecer alguns dos mais ilustres espíritos do tempo. Foi amigo de Ramalho Ortigão, Eça de Queirós, Guerra Junqueiro, Fialho de Almeida. Distinguia-se como poeta e como homem do mundo. Ramalho Ortigão assim o definiu: "Como poeta, ele é um primeiro adido à legação da elegância... O seu estilo tem um lavor de renda, uma suavidade de veludo e um fresco perfume de toilette." Tinha predileção pelas cidades da arte e do pensamento. O poeta celebra Londres, celebra Roma. Mais que tudo, porém, recorda o seu país. Suas principais obras são Corimbos e Sonetos e rimas.


O primeiro representa a fase em que vivia no Brasil (1862 a 1872); o outro, o período em que residiu na Europa. A apreciação de críticos e estudiosos como Vicente de Carvalho, Medeiros e Albuquerque e Carlos de Laet, foi de pleno reconhecimento da poesia de Luís Guimarães Júnior. Seus sonetos revelam um grande apuro da forma, combinações métricas finas e sutis, e o gosto pelos motivos exóticos que ele pôde sentir e observar em suas peregrinações por terras estrangeiras. Romântico de inspiração, mas já dentro da orientação parnasiana, ele foi, no apuro da expressão, um precursor da poesia de Raimundo Correia, Bilac e Alberto de Oliveira.

OBRAS
* Lírio branco, romance (1862);
* Uma cena contemporânea, teatro (1862);
* Corimbos, poesia (1866);
* A família agulha, romance (1870);
* Noturnos, poesia (1872);
* Filigranas, ficção (1872);
* Sonetos e rimas, poesia (1880);
* As quedas fatais, teatro;
* André Vidal, teatro;
* As jóias indiscretas, teatro;
* Um pequeno demônio, teatro;
* O caminho mais curto, teatro;
* Os amores que passam, teatro;
* Valentina, teatro;
* A alma do outro mundo, teatro (1913).


Fonte: ORKUT Comunidade Confraria Poética II

OLGA SAVARY


Olga Savary nasceu em Belém do Pará, em 21 de maio de 1933, e é carioca por adoção. Escritora (poeta, contista, romancista, crítica e ensaísta), tradutora e jornalista, tem inúmeros livros publicados, tendo sido agraciada com vários dos principais prêmios nacionais de literatura, entre eles o Prêmio Jabuti de Autor Revelação, pelo livro Espelho Provisório, concedido pela Câmara Brasileira do Livro (1971), o Prêmio de Poesia, pelo livro Sumidouro, concedido pela Associação Paulista de Críticos de Arte (1977), e o Prêmio Artur de Sales de Poesia, concedido pela Academia de Letras da Bahia pelo livro Berço Esplêndido (1987).

Traduziu mais de 40 obras de mestres hispano-americanos (Borges, Cortázar, Fuentes, Lorca, Neruda, Octavio Paz, Semprún, Vargas Llosa e outros), e os mestres japoneses do hai-kai, (Bashô, Buson e Issa).

Correspondente de revistas culturais no Brasil e no exterior, organizou várias antologias de poesia, entre as quais a maior e mais completa já editada no Brasil, para a Secretaria Municipal de Cultura – Fundação RioArte / Rio de Janeiro. Representou o Brasil no Poetry International (1985), congresso mundial realizado em Roterdã. Sua obra está presente em diversas antologias brasileiras e internacionais.

A Antologia de Poesia da América Latina, editada na Holanda em 1994, com apenas 18 poetas — inclusive dois prêmios Nobel: Neruda e Paz — inclui Olga Savaryentre os maiores poetas do continente. Além de seu trabalho profissional integralmente dedicado à literatura desde 1947, Olga Savarytem presença ativa em instituições culturais e comunitárias: é membro titular do Pen Clube (associação mundial de escritores, vinculada à Unesco), da Comissão de Defesa da Liberdade de Imprensa e Direitos Humanos da ABI (Associação Brasileira de Imprensa) e do Instituto Brasileiro de Cultura Hispânica.

Foi presidente do Sindicato de Escritores do Estado do Rio de Janeiro em 1997-98. Por serviços relevantes prestados à cultura nacional, foi escolhida "Mulher do Ano" pelo jornal O Globo, em 1975, e pela Secretaria Municipal de Cultura de São Paulo, em 1996.

Na poesia radicalmente feminina de Olga Savary, o vigor poético se alia a uma profunda brasilidade. As raízes culturais brasileiras estão presentes ao longo de sua obra, inclusive no uso sistemático de palavras em tupi, língua original falada em Pindorama, depois Brasil. Com as comemorações dos 500 anos da descoberta do Brasil, nada mais justo e oportuno, portanto, do que a homenagem que a Fundação Biblioteca Nacional (em parceria com a Universidade de Mogi das Cruzes e a MultiMais Editorial) fez a Olga Savary, com a edição de sua Obra Reunida em Repertório Selvagem.

OBRAS

Espelho Provisório (poemas), 1970
Sumidouro (poemas), 1977
Altaonda (poemas), 1979
Magma (poemas), 1982
Natureza Viva, (poemas), 1982
Hai-Kais (poemas), 1986
Linha D'água (poemas), 1987
Berço Esplendido (poemas), 1987
Retratos (poemas), 1989
Rudá (poemas), 1994
Éden Hades (poemas), 1994
Morte de Moema (poemas), 1996
Anima Animalis (poemas), 1996
O Olhar Dourado do Abismo (contos), 1997
Repertório Selvagem - Poesia Reunida, 1998

OUTROS GÊNEROS LITERÁRIOS

Conto

– O olhar dourado do abismo. (1997).

Jornalismo Literário, Crítica e Ensaio

– As margens e o centro(1998)
– Ladrão de alma.
– Mão no fogo.

Infanto - Juvenis

– Quem tudo quer... vira arco-íris.
– Alegria de viver..

Antologias organizadas pela autora

– Carne Viva – I Antologia brasileira de poesia erótica. Poesia. (1984).
– Antologia da nova poesia brasileira. Poesia. (1992)
– Hai-kais brasileiros. Poesia.

Fonte: ORKUT Comunidade Confraria Poética II

SIGNO



Há tanto tempo que me entendo tua,
exilada do meu elemento de origem: ar,
não mais terra, o meu de escolha,
mas água, teu elemento, aquele
que é do amor e do amar.

Se a outro pertencia, pertenço agora a este
signo: da liquidez, do aguaceiro. E a ele
me entrego, desaguada, sem medir margens,
unindo a toda esta água do teu signo
minha água primitiva e desatada.

Olga Savary

Casa de Morar


casa de morar

juntar telhas é esconder
o céu remendar o teto
proteger do dia
espantar mosquitos

comprar uma moldura de madeira
sem ter o que emoldurar
é desenhar na parede
um retângulo
é recortar o ar

erguer escadas é empilhar
degraus é levar pro
teto é trotear
pro térreo

não tem cabimento esse chão que cobre tudo

Olga Savary

28 de mar. de 2009

SEMEAR



Nuvens alvissareiras
No céu sem limites.
Na bagagem:
O sol matreiro,
A chuva dengosa,
O silêncio dos montes,
Flores e fontes,
O aconchego da noite...

Amplidão cósmica,
Beijos aninhados
No perfume da brisa,
No lamento da saudade...
Tudo é liberdade,
Paz,
Felicidade.

Pássaros viajores
Permeiam a paisagem,
Semeando a ternura do afago,
Doce transparência da imagem.
E a oração se faz
Na doçura do olhar,
No desejo de amar,
De ser bom,
De multiplicar...

Genaura Tormin,

MUNDO DE FANTASIA


Sonhei que a vida era diferente.
Cheinha de coisas boas, muita alegria,
Bondade e sabedoria.
E as pessoas eram contentes.

Vivendo a minha fantasia,
Fechei os olhos e vi, por um momento,
Os prados, as flores e o firmamento
A comungarem conosco a harmonia.

Sonhei com a dignidade,
E vi os mendigos abrigados,
Bem vestidos e alimentados,
No exercício da cidadania.

Era um mundo de magia,
Sem dor, sem fome, sem horror.
Somente a voz do amor,
Essência holística da sabedoria.

Genaura Tormin

27 de mar. de 2009

Afonso Estebanez


Afonso Estebanez Stael nasceu em 30 de outubro de 1943 no ambiente agreste do município de Cantagalo, Estado do Rio de Janeiro, filho de Manoel Stael e de Francisca Estebanez Stael, descendentes de ancestrais ciganos emigrados para a Espanha e de alemães de origem judaica radicados nas regiões agrícolas da Bélgica, que posteriormente imigraram para o Brasil, entre 1820 e 1930. Iniciavam-se os contatos imediatos do primeiro grau do poeta com a paz dos campos, das bucólicas cidades do interior e das serras encachoeiradas do solo fluminense. Enquanto isso, preparava-se o país para a irreversível eclosão da Segunda Guerra Mundial, que contaria com o envio de tropas brasileiras ao front da Itália.

Durante a penosa ronda migratória de sua humilde família por diversas fazendas decadentes do interior dos Estados do Rio e Minas Gerais (1943/1953), A. Estebanez alfabetizou-se sozinho, com o parco auxílio dos irmãos mais velhos que o orientavam precariamente na formulação da escrita e dos sons mágicos das palavras mais simples da cartilha “Meu Brasil” e do caderno “Avante” folheados à luz bruxuleante da lamparina a querosene. Com a declaração da 2ª Grande Guerra, falava-se do envio dos pracinhas da Forças Expedicionárias Brasileiras para Anzio, na Itália. Repercutia no país a notícia da queda do Estado Novo, palco da contraditória ditadura de Getúlio Vargas, até hoje não julgada com clareza pela História.

Os Estados Unidos despejavam a primeira bomba atômica sobre a populosa cidade japonesa de Hiroshima. O país promovia o Congresso Brasileiro de Escritores. Iminente o apogeu do Rádio no Brasil. Conferência de Yalta. Roosevelt, Churchill e Stalin se abraçam numa obscura aliança para a divisão do bolo recheado com os iminentes escombros do nazismo. Com o lançamento da segunda bomba atômica sobre Nagasaki, o Japão se rende ao domínio aliado. Cinqüenta milhões de vítimas inocentes. Cria-se a Organização das Nações Unidas (ONU). Os imperialistas americanos tomam as lendárias províncias portuárias de Okinawa.

O Brasil pintado de verde-vermelho estabelece laços de amizade política com a União Soviética. Promulgada a quarta Constituição Federal (1946). Hungria se transforma em República. Apelidam a Rússia de “Cortina de Ferro”. Polônia e Hungria dissolvem suas bases partidárias comunistas (1947). Plano SALTE (1948). O Brasil rompe o namoro de conveniência com a União Soviética. Exigência norte-americana do casamento brasileiro com a Carta dos Direitos Humanos. Criação do Clube do Livro. A Suprema Corte dos Estados Unidos declara a igualdade de educação entre brancos e negros. Assassinam a Mahatma Gandi e tem início a escalada do terrorismo internacional ideológico.Vitória da gloriosa Revolução Chinesa (1949).

Fundação da Cinematográfica Vera Cruz (1950). Revive pela segunda vez o obscuro e polêmico governo de Vargas no Brasil, extinto com o suicídio do caudilho gaúcho em 1954. Inauguração da PRF-3 Tv Tupi, primeira emissora de televisão do país. A Líbia se declara independente perante o mundo e a monotonia da arte impressionista inspira a criação da poesia concreta. A Universidade do Tenesse (USA) abre as suas estreitas portas para o primeiro estudante negro (1952). O poder bélico americano anuncia a festejada criação da Bomba de Hidrogênio ou “BombaTruman”, como ficou conhecida.

Mas numa noite numerosa e quente de fevereiro de 1954, na carroceria de um velho caminhão Chevrolet, sentado numa caixa de Sabão Português repleta de recortes de notícias do Jornal do Comércio que o biografado manuseava na obstinada tentativa da auto-alfabetização iniciada nos assombrados salões coloniais da Fazenda da Quinta – produtora de leite e cana-de-açúcar – situada próximo às margens do Rio Paraíba que por ali serpenteava, A. Estebanez deixou o bucólico ambiente rural, onde faziam parte de suas observações infantis as batidas pelas matas e picadas, entre os cambarás e os assa-peixes que engrinaldavam as inocências de capoeirões carrancudos, indo assim regularizar seus estudos fundamentais na pachorrenta cidade do Carmo/RJ.

Sem concluir o curso primário (cursava ainda a 3ª série), obteve autorização especial da Secretaria de Educação e Cultura, sendo precocemente aprovado nos exames de Admissão ao Ginásio do Seminário Arquidiocesano São José no Rio de Janeiro (1956), onde estudou até 1962. E já sob a influência dos contatos imediatos do segundo grau com os clássicos das literaturas brasileira e universal, colaborou na criação de jornais murais, revistas, grêmios literários e venceu concursos de literatura (poesia e prosa) de academias internas da clausura (1961).

No cenário externo recrudesciam as forças polivalentes da guerra fria, da política contra o apartheid e da expectativa multifacetada da espionagem internacional. No palco interno fomentavam incomensurável prestígio a recém-criada alavanca da comunicação de massa, o início do período do desenvolvimento industrial, a indústria automobilística e a expectativa nacional do advento da neodemocracia do governo Juscelino Kubitschek. O islamismo redirecionava o coração religioso do Egito. Vêem-se o resplendor do nascimento da Bossa Nova e do renascimento do futebol brasileiro, campeão do mundo em 1958. Inglaterra e Estados Unidos celebram pacto de fusão nuclear controlada.

A REVOLUÇÃO CUBANA assume seu papel de destaque social, político e cultural no cenário mundial (1959). A ONU aprova a Declaração Universal dos Direitos da Criança. Indira Gandhi é eleita presidente do Partido do Congresso da Índia. Brasília é inaugurada como um milagre realizado sob os aplausos da popularidade de Kubitscheck, enquanto Martin Luther King era reconhecido como líder do Movimento Negro nos Estados Unidos (1960). Parcialmente eleito sob a influência dos movimentos culturais e revolucionários ibero-americanos, Jânio Quadros, pouco tempo depois de sua posse, renuncia à chefia do governo brasileiro.

Em 1962, A. Estebanez desistiu do itinerário sacerdotal e matriculou-se no Colégio Batista de Niterói, onde freqüentou o Curso Científico até o 2º ano, graças ao então chefe do governo do Estado do Rio de Janeiro, Badger Silveira, que lhe concedeu parcial bolsa de estudos, e ao notável educador evangélico Samuel de Souza, diretor daquele educandário, que lhe privilegiou com isenção do pagamento do restante da bolsa. O ex-governador Celso Peçanha deu-lhe o ofício de técnico de laboratório de solos no Departamento de Estradas de Rodagem da Secretaria de Transportes, mas em seguida veio a convocação para servir ao exército onde se alistou sem concluir aquele curso.

O biografado apresentou-se para ser soldado e fizeram dele Cabo de Infantaria, renunciando à condição de membro do Corpo Permanente de Oficiais da Reserva (CPOR). Admite com orgulho ter sido herói dele próprio durante o obscuro golpe militar de 1964, uma vez que “não precisou tirar a vida de ninguém” naquela revolução de emboscada política. Mesmo assim, foi bem condecorado, nenhuma patente ou medalha recebeu, senão meia lauda de elogio oficial no Boletim de Ordem do Dia em que deu baixa do serviço militar (julho/1964), ainda sob o comando – diz o soldado-poeta – de um dos mais eloqüentes patriotas que já conheceu – Gen Dilermando Gomes Monteiro.

Da caserna, o poeta assistira ao rumoroso rompimento entre Cuba e Estados Unidos, acompanhou ao Movimento do Cinema Novo, a criação do Centro de Cultura Popular da UNE (União Nacional dos Estudantes) e a assunção turbulenta de João Goulart ao comando do governo brasileiro. Passou pelo plebiscito popular que revogou o parlamentarismo no país, aplaudiu o Movimento de Educação de Base fundado nas idéias revolucionárias do ensino nacional legado por Paulo Freire e protestou, em “Contagem Regressiva” e “Livro de Viagem e do Depoimento” – dramáticos poemas de resistência – a contagem decrescente que “zerou” no trágico desmoronamento da democracia global através do assassinato abominável de John F. Kennedy, numa exibição de tragédias humanas comparáveis aos retrocessos históricos revelados no Julgamento de Auschwitz.

Dispensado da caserna em 1964 quando teve início a ditadura militar implantada no Brasil a partir de 31 de março daquele ano, o biografado voltou ao exercício de suas funções na Secretaria de Transportes do Estado e assentou matrícula no Colégio Universitário da UFF (1965), concluindo o Curso Clássico. Em jornais como “O Fluminense” e “A Tribuna” já eram publicados trabalhos seus da primeira fase (poesia acadêmica). A sonda norte-americana Ranger VI acaricia à Lua e a Guerra no Vietnã põe o mundo em estado de alerta e de perplexidade. Estebanez prestou os exames para os cursos universitários de Direito e de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade Federal Fluminense (UFF), atual Instituto de Letras, tendo sido aprovado com louvor em ambos (1966). Ainda no 3º ano do curso de Filosofia, foi nomeado pelo Reitor da Universidade, Prof. Rosalvo do Vale, para integrar o corpo docente da Faculdade como Monitor da Cadeira de Literatura Portuguesa, então sob a regência da eminente catedrática Prof. Albertina Fortuna Barros, sob cuja direção lecionou Literatura Provençal durante um ano.


Já havia publicado o seu primeiro livro “Canção que Vem de Longe”, prefaciado por Lyad de Almeida, saudoso haicaista fluminense e eminente juiz-desembargador do Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região (TRT-Rio), recentemente falecido. Lecionou também Latim e Matemática em colégios e institutos educacionais de Niterói e recebeu algumas menções honrosas em torneios universitários e oficiais de poesia. Ministrou palestras e conferências sobre “Poesia Romântica” e “Poesia Moderna” no Instituto Abel de Niterói e na Escola Normal Nossa Senhora da Paz, em São Gonçalo. Promoveu recital de Poesia na Academia Fluminense de Letras e no Liceu Nilo Peçanha em Niterói (1968). Concedeu entrevista ao “Jornal da Noite”, programa radiofônico de grande repercussão no meio artístico fluminense. Neste mesmo ano casou-se com a professora universitária carioca Isis Celeste de Castro Estebanez Stael, com a qual celebrou o nascimento de seu primeiro filho, Alessandro de Castro Estebanez Stael (1970).

Nesse ínterim, a espaçonave Vênus III, lançada pela União Soviética durante a adolescência da corrida espacial, aterrissa em outro planeta (1965). O governo de exceção edita o Ato Institucional nº 2, que extingue o bipartidarismo político representado pela Aliança Renovadora Nacional (ARENA) e Movimento Democrático Brasileiro (MDB). O regime militar edita o Ato Institucional nº 3 e impõe eleições indiretas para governador e vice no país (1966). Das cinzas dos escombros deixados pelo massacre cultural da arte no país surge o ingênuo e romântico Movimento Artístico Tropicalista (1967).

Fugindo da perseguição maniqueísta, velada ou explícita, do regime militar dos anos 1968/70, o biografado não pôde concluir o curso superior de Filosofia, vendo-se compelido a trancar matrícula no limiar do quarto e último ano. Porém, convidado pelo governo progressista de Geremias de Mattos Fontes, tornou-se agente comunitário do Plano Piloto para Educação de Adultos Analfabetos do Programa “ABC-Fluminense”, função que também exerceu sob risco de perseguição, mesmo porque o interesse imediato pela educação de massa não era, na ocasião, a matéria prima de ponta da sedimentação do regime militar.

Na época, um dos símbolos nacionais mais eloqüentes da bandeira levantada pelos estudantes universitários contra a repressão, ainda era o recente assassinato, pela Polícia Militar do Estado, do estudante Edson Luiz Souto, durante a conhecida “Revolta do Restaurante Calabouço” em 1968, no Rio de Janeiro, nascida das reivindicações dos estudantes por alimentação mais digna e reforma das instalações do refeitório da Universidade Federal (UFRJ). Esse fato serviu de candente lit motiv cultural para o clássico romanceiro popular de mobilização da sociedade em direção à “Marcha dos Cem Mil” contra a usurpação do estado de direito democrático no país.

Mas era o início do ilusório Milagre Brasileiro (1970). Instituía-se a Loteria Esportiva Brasileira, um “jogo do bicho” mais sofisticado e menos acessível à população sem vale salarial de fim-de-semana no bolso. A seleção brasileira de futebol nos trouxera o tricampeonato mundial aos empurrões desvairados dos slogans da propaganda fascista do regime: “Ame-o ou deixe-o”, “Todos juntos vamos...” e “Pra frente Brasil”. Mas o milagre brasileiro não conseguia controlar a política marginal do Esquadrão da Morte concebido pela repressão – reconhecido e escandalizado a partir de 1971 – nem das demais organizações clandestinas de extermínio de civis inocentes ou militantes, indiferentemente, nos crimes comuns ou nos movimentos políticos de resistência ao regime, considerados subversivos, julgados e condenados sumariamente sem o devido processo legal.

Nesse clima é que o biografado, sem nenhum alarde em face do estigma da censura, publicou, por instância audaciosa da Livraria São José, o seu segundo trabalho literário, o “Livro de Viagem ou do Depoimento”, cujo carro-chefe era o poema do mesmo nome, cassado pelos motivos agora relatados. Por causa deles, A. Estebanez, com o auxílio do Secretário do Interior e Justiça do Estado, deputado Saramago Pinheiro, e do democrata poeta-general Mário Barreto França, seus conselheiros de penumbra, refugiou-se em Nova Iguaçu e Itaguaí, onde foi “indicado”, por “simpatizantes seus” que eventualmente serviam ao governo de exceção, como diretor do Ginásio e da Escola Normal Luiz Murat, Educandário da Campanha Nacional de Escolas Comunitárias (CNEC), com liberdade vigiada pelo regime de atenciosas preocupações fixadas naqueles turbulentos municípios da grande baixada fluminense.


Nos anos de 1968/69/70 o poeta conquistou três troféus “Casimiro de Abreu” como finalista dos 1º, 2º e 3º Torneios Nacionais da Poesia Falada, patrocinados pelo governo do Estado do Rio de Janeiro, onde apareceram, como competidores de escol da vanguarda literária nacional, os nomes de Alphonsus de Guimarães Filho, Lacyr Schetino, Geir Campos, Homero Homem, Anderson Braga Horta, Walmir Ayala, Ayrton Pereira da Silva, Emil de Castro, Carlos Nejar, entre vários outros que – insubmissos aos velhos cânones da literatura meramente acadêmica – que agradava ao regime – concorreram para a apresentação da nova face da poesia brasileira (a poesia de resistência).

Integraram então as fileiras literárias e artísticas do Grupo Salina de Niterói (sol grosso no açúcar refinado), o Pascoal Carlos Magno, o Luiz Antônio Pimentel, o Gastão Neves, o Miguel Coelho, o Francisco Maciel, o Pedro Paulo Gavazzoni, o César de Araújo, o Carlos Macedo Couto, o Fernando Gonçalves, o Oriovaldo Rangel, o Silésio Nascimento e os outros mais que tinham como propósito contrariar a mesmice perfumada dos movimentos literários de salão. A ideologia do grupo era simples como o pássaro e prudente como a serpente: a universalização da particularidade humana.

O mundo inteiro ainda se mostrava francamente consternado com a costumeira sucessão de golpes militares desfechados contra a cidadania e as liberdades do povo argentino ao longo da história, guardando na memória ainda que, em 1966/67, a ditadura suprimira de vez as liberdades democráticas e os direitos políticos de numerosas organizações e personalidades, dissolvendo o Congresso e as legislaturas provinciais de nossos irmãos portenhos. A Rússia, os Estados Unidos e a Grã Bretanha haviam firmado acordo em Moscou para garantir o uso pacífico do espaço (1968). Caíra sobre a reconstrução política do povo brasileiro a “bomba atômica doméstica” do Ato Institucional nº 5. Da solidão advinda da perda da identidade cultural, vem aos brasileiros o consolo da arte tropicalista aleatória.

Os “porralocas” dos espaços culturais alternativos daquela odisséia descontrolada já não acreditavam em ninguém com mais trinta anos. Os olhos da América estuprada pelo colonialismo ianque haviam-se voltado para os conflitos detectados pelas espoletas sismográficas despertadas entre os universitários da USP e os estudantes engajados do Mackenzie (SP). Havia-se mascarado o fracasso do regime de bota e espada com a criação da Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil. A sonda espacial americana Surveyor 7 também tocara a pele macia da superfície lunar. O governo casuistico de Costa e Silva tropeçava na contramão da história, em cima do muro da contradição política nacional.

O embaixador americano no Brasil era seqüestrado. Os astronautas norte-americanos Neil Armstrong e Buzz Aldrin ainda flutuavam nos poentos mares da lua, pela primeira vez na história da humanidade. O estudante Jan Palach ateava fogo em si mesmo, morrendo na Praça Wenzem, em Praga, em protesto pela ocupação soviética da Checoslováquia (1969). A mediocridade da economia acadêmica brasileira enchia os olhos ufanistas da pseudoburguesia defensora da construção da transamazônica. A sonda espacial Mariner IX transmitia as primeiras fotos do planeta Marte.

A Tv a cores chegava ao país do futebol. Os Estados Unidos e o Vietnã do Norte promovem tratado para pôr um fim àquela guerra do nunca. A partir de 1973, Augusto Pinochet passaria a retratar-se como o mais novo caudilho sul-americano, odiado pela alma libertária do povo chileno que se exilava pelo mundo afora.

A ciranda cultural do Grupo Salina chegaria a fazer roteiro artístico nas embaixadas de vários países europeus e sul-americanos onde Che-Guevara pudesse ser interpretado como um modelo de “poeta-embaixador dos movimentos revolucionários da América Latina”. O grupo não escolhia momento nem lugar. Não era um serviço meteorológico da arte no Brasil. Mas divulgava a poesia falada em seu estado bruto, vista como engajada.

Levava para o aconchego das praças públicas e pátios das universidades as evidências sócio-políticas contidas nas mensagens emergentes de Fernando Pessoa (poeta português universalista mais lido no mundo), Pablo Neruda (poeta socialista chileno e Prêmio Nobel de Literatura em 1971), Garcia Lorca (poeta mais perigoso com a caneta do que outros com o revólver), José Marti (o grande mártir da Independência de Cuba em relação à Espanha), Maiakóvsky (o primeiro poeta russo moderno a engajar política e ideologia à poesia), Bertold Brecht (poeta socialista renovador russo e Prêmio Lênin da Paz em 1954), Mao Tse-Tung (poeta chinês teórico, marxista, político, revolucionário, soldado e governante comunista da República Popular da China) e Ho Chi Minh (o nome mais conhecido do grande líder revolucionário do povo vietnamita e dos povos explorados em todo o mundo), passando por Rimbaud (jovem pensador francês considerado gênio da literatura revolucionária, para quem a poesia não serviria para ritmar a ação, mas para antecipá-la), Tagore (escritor e poeta indiano, cuja obra oferece ao mundo uma mensagem humanitária e universalista), Omar Khayyan (poeta, matemático, astrônomo e reformista islâmico, defendia a idéia de que não é possível esquecer os milhares de comunistas que têm sido martirizados pelos falsos profetas do islamismo primário que sempre operou a serviço do imperialismo) e Eugene Evtuchenko (poeta soviético que relata as visões e anseios de uma geração que, mesmo não tendo visto de perto os horrores da guerra, tem sofrido suas dramáticas conseqüências; em estilo épico-lírico que lembra o de Vladímir Maiakovski, Evtuchenko polemiza o enfrentamento ao conformismo intelectual e artístico a que deu lugar o cenário stalinista).

Com efeito, a revolução cubana introduzira a hispano-americanização nos ambientes universitário e artístico brasileiros. Até Ferreira Gullar declamava em público a canção Guantanamera! Conforme análise erudita de Anibal Bragança, “passaram a ser conhecidos entre nós Violeta Parra, Mercedes Sosa e outros” ícones do espírito revolucionário em voga naquela época. Dizia-se que a denúncia, a contestação e a busca da mobilização do público marcavam a disposição daquele movimento cultural.

Mas com o golpe militar, “iniciou-se um novo ciclo de políticas de exclusão social e concentração de renda que, continuadas nos diferentes governos autoritários e democráticos, levaram o nosso país ao lugar que hoje ocupa no cenário mundial de campeão da desigualdade social, com as terríveis conseqüências para a educação e para a vida social, econômica e cultural que todos conhecemos, sem espaço para as esperanças que então mobilizavam jovens, estudantes secundários e universitários, trabalhadores, artistas e intelectuais, militares e empresários que foram derrotados em seus projetos em favor do Brasil, sendo então expulsos, banidos, presos e mortos E mais, muitos foram atingidos pelas malhas subjetivas da culpa, da frustração, da angústia, pela inadaptação ao modelo dos vencedores” (Anibal Bragança, professor de aguçado espírito analítico da Universidade Federal Fluminense, em comentário sobre a obra literária de César de Araujo).

Estebanez então se tornaria bacharel em Direito em 1971, mas foi aquela noite de 15 para 16 de dezembro de 1970 que marcou para sempre a sua trajetória artística, quando o que seria o prêmio mais importante de sua vida literária foi tesourado pelo serviço de censura da Delegacia de Ordem Política e Social (DOPs), com o auxílio dos desafetos oficiais da poesia de contestação. Naquela noite, Glória Menezes, Zilka Salaberry e Maria Pompeu, num gesto simultâneo de proteção quase maternal, estenderam generosamente sobre o poeta em fuga as densas barras de seus longos vestidos de inspiração indiana, tentando ocultá-lo do dies irae da polícia política. O Teatro Municipal de Niterói estava repleto.

Os amantes da arte das ribaltas das ruas e calçadas iriam conhecer o vencedor do 3º Torneio Nacional da Poesia Falada. Até aquele momento dramático ninguém sabia ao certo o que significava uma “POESIA FALADA”. Mas o governador Geremias de Mattos Fontes já o havia explicado através da imprensa alvoroçada: “Eis um dos mais válidos movimentos de cultura que se pode realizar no país. (...). A poesia falada, como toda a arte, é ilimitada na sua mensagem. Além dos mistérios próprios dela, o que há de visível e poupável, se realiza em nós. Ela sutiliza o espírito, quebra o que há de pedra em cada um. Aprimora a linguagem, veste de sensibilidade um povo e nos mostra, com os olhos concretamente reais, um mundo real e melhor. A poesia falada tem o privilégio do contato vivo com o público. Leva a mensagem humana de homem a homem. Cumprimenta-nos quando há sol e noite. Caminha ao nosso lado. Companheira. Mas não refúgio, fuga ou medo. É arma de amor!”.

Concorria Estebanez com um poema politicamente arrojado, o “Livro de Viagem ou do Depoimento”. Foi literalmente forçado, então, a submeter-se a uma reunião “sigilogística” realizada às pressas nos bastidores do Teatro João Caetano. A Polícia Federal da repressão informou pessoalmente ao biografado que sua composição havia sido condenada, censurada, cassada ou sei lá o quê, pela censura e que não haveria festa nem televisão no ar (Rede Globo) se o autor do “Livro de Viagem...” insistisse na sua apresentação, o que deveria ser realizado juntamente com o ator global (e intérprete) Paulo Padilha (falecido), na esperança de conquistar o prêmio de “melhor poesia nacional” daquele ano. Cassiano Ricardo, presidente do Júri Literário, indignado, desfechou um golpe com a mão esquerda fechada sobre a mesa dos jurados e, censurando aquele inoportuno ato de censura, bradou: “Não se pode mais fazer arte no Brasil!”.

Naquela noite de caça à bruxa, o importante prêmio de consolação de A. Estebanez foi o beijo paternal de Cassiano Ricardo que o convocou: “Filho, vamos caçar papagaios!”, fazendo explícita referência à sua própria obra que tanto escândalo causou durante a Semana de Arte Moderna de 1922. O biografado não foi censurado – confessa – por ter escrito que “meu povo era a mulher de todos”, mas sim por ter tentado explicar aos agentes federais que minha gente submetida da América deBaixo era a mulher rendida da América de Cima, numa alusão lírica e até ingênua (conforme colocação da imprensa na época) ao imperialismo colonialista norte-americano que, desde a segunda metade do século passado, vinha fomentando o processo ideológico de “anticomunistomanialização” das nações sul-americanas subservientes, impondo riscos à soberania política do nosso país e à expectativa de maturidade econômica do povo brasileiro. Por causa disso, teria sido preso: “PRIMEIRO que tudo aceito a tirania da saudade que levo como prova desse amor envergonhado:minha gente submetida da América deBaixoé a mulher rendida da América deCima”.

O Grupo Salina não suportava nenhuma espécie de ditadura. A não ser a do amor universal sem fronteiras nem modelos estereotipados. Além de Cassiano Ricardo, outros importantes membros do júri estavam perplexos: Adonias Filho, Fernanda Montenegro, Fernandes Soares, Hildon Rocha, Bandeira de Mello, Maria Luiza Queiroz, Raymundo Magalhães Júnior, todos, todos estavam indignados e atônitos. Cassiano Ricardo, Adonias Filho, César de Araújo, Diva Vasconcellos Rocha, Fernanda Montenegro, Fernandes Soares, Hildon Rocha, Manoel Caetano Bandeira de Mello, Maria Luiza Queiroz, Raymundo Magalhães Júnior e Reynaldo Jardim. Governador do Estado: Geremias de Mattos Fontes. Secretário de Educação e Cultura: Rinaldi da Silva Venâncio. Diretor do Departamento de Difusão Cultural: Gastão Neves.

Em 1975 o poeta foi iniciado nos Mistérios da Maçonaria Simbólica do Brasil através da Loja Maçônica Baden Powell Sétima nº 35, da qual foi Venerável Mestre, célula da Grande Loja do Estado do Rio de Janeiro, potência da qual foi Grande Orador (Procurador-Geral) por ocasião do Grão-Mestrado do ex-ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Doutor Waldemar Zweiter, e do renomado odontólogo da Baixada Fluminense, Doutor Paulo Elias. Nesse clima surgiu uma antologia literária contendo poemas de inspiração maçônica, “Em Tempo de Lótus, Lírios e Acácias...” (1978), em parceria com os poetas maçônicos J. Alves Filho e J. A. Galdino da Costa, obra prefaciada pelo escritor F. A. Gomes Neto, advogado, Promotor Interino e Adjunto, ex-Juiz de Direito aposentado na 1ª Vara de Araçatuba, Doutor em Direito Público, membro efetivo do Instituto dos Advogados Brasileiros, jurista, jornalista, conferencista e poeta.

Nesse clima foi produzido o trabalho “Reflexos da Ação Maçônica na Formação do Estado Brasileiro”, tese defendida durante a XI Assembléia Geral da Confederação da Maçonaria Simbólica do Brasil, aprovada por unanimidade na sessão de 16/06/79. Era então Grão-Mestre da Grande Loja do Estado do Rio de Janeiro o ex-ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) o notável jurista Waldemar Zweiter.

De 1975 a 1988, decorreram doze anos de angustiosas dificuldades de sobrevivência para o biografado que, mesmo distanciado de seu antigo grupo de escritores e poetas, jamais deixou de produzir. Exerceu advocacia trabalhista de partido pelo Sindicato dos Eletricitários e Gasistas da base territorial do Rio de Janeiro, onde dirigiu o departamento jurídico da entidade, e pela Federação Nacional dos Trabalhadores nas Indústrias Urbanas do Rio de Janeiro, como assessor jurídico para assuntos legislativos de interesse dos trabalhadores da categoria junto às duas Casas do Congresso Nacional.

Suavizava com a doçura da doutrina operária de Pablo Neruda as agruras dos trabalhadores urbanos, em permanente assembléia geral pela causa. Era o início da política de distensão gradual no Brasil (1974/75). Assistia-se ao polêmico acordo nuclear Brasil-Alemanha e ao escândalo do Watergate nos Estados Unidos, enquanto morria na prisão do regime militar o jornalista Wladimir Herzog. Margareth Tatcher tornara-se presidente do Partido Conservador Britânico. Tudo conspirava contra os interesses dos trabalhadores, até que eclodissem os movimentos escancarados pela emancipação geral da mulher em 1976. O clima de rancor racista mundial começava a ser vencido com a Independência de Angola. Logo veio a promessa da Revogação do AI-5 no Brasil (1977).

No seio da família, Estebanez perde a filha Ludmila que veio à luz natimorta. Esse fato repercutiria tanto na esfera emocional do poeta, que os já frágeis alicerces do seu casamento ruíram para sempre. No ambiente trabalhista também repercutiria, negativamente, o referendo que deu ao general Stroessner o cargo de presidente vitalício do vizinho Paraguai e, positivamente, a organização dos Sindicatos dos Metalúrgicos em São Paulo. Em compensação, a China anuncia o fim de dez anos de proibição da leitura de setenta renomados escritores internacionais como Platão, Charles Dickens, William Shakespeare e Victor Hugo. E também assistiu-se, de pé, a efetiva Revogação do AI n° 5, acompanhada da reclamada Lei da Anistia (1979) que extinguiu o bipartidarismo e constituiu o pluripartidarismo no Brasil. Sobreleva neste ponto a Revolução Sandinista na Nicarágua e as greves operárias no ABC paulista que seriam, vinte e um anos mais tarde, a alavanca que deslocou Luiz Inácio Lula da Silva da condição de operário da esquerda mais anarquista à condição de presidente da República da direita menos anarquista.

No início ainda da década de 80, voltam aos palcos nacionais da cultura popular o musical Calabar, de Chico Buarque de Hollanda e Ruy Guerra, e o filme Z , do diretor grego Costa-Gravas, então liberados pela censura federal, depois de estarem proibidos desde 1973. Depois de alongados anos de mordaça política e cultural, o biografado institui no âmbito dos trabalhadores urbanos o 1º FESART- Festival de Arte dos Trabalhadores patrocinado pelo órgão sindical ao qual servia como advogado, escritor e jornalista (1981). Explodiria no Riocentro, durante um show de música popular, uma bomba desastrosa de fabricação paramilitar, em circunstâncias letais contrárias aos seus próprios fabricantes.

Em seguida, foi anunciada a Guerra das Malvinas (1982). Com o fim do primeiro casamento, as atenções do biografado voltaram-se para uma nova relação amorosa com Lucian Rodrigues Estebanez Stael, uma jovem de dezenove anos originária de família humilde de Cordeiro/RJ, com a qual teve dois filhos: Mark Rodrigues Estebanez Stael (1983) e Johanna Rodrigues Estebanez Stael (1992), lembrando que adotou de fato como também seu, o filho do primeiro casamento da companheira, Maykel Rodrigues Alves, então com três anos de idade. Em 2002 essa união se transformaria numa relação consensual aberta.

Mas antes, dedicado exclusivamente aos movimentos dos trabalhadores liderados pela Federação Nacional, o poeta, com a redação da propaganda explícita, colaborou pessoalmente para a realização da maior campanha cívica já promovida no Brasil: as “DIRETAS JÁ”, que pedia eleições diretas imediatas para a presidência da República. Esses movimentos foram realizados simultaneamente em todo o território nacional, destacando-se os do Largo da Candelária, no Rio de Janeiro, e o da Praça da Sé, em São Paulo. Realizadas as eleições (1984), Tancredo Neves venceu a Paulo Maluf e seria o primeiro presidente brasileiro civil, desde o golpe militar de 1964. Tancredo morreria ainda antes da posse. Em seu lugar, o vice José Sarney assumiu a presidência. Na corrida espacial, a espaçonave Challenger explodiu 73 segundos após ter sido lançada. O acidente matou seis astronautas e a professora Christa McAuliffe, primeira civil a participar de um programa espacial (1986).

Em 1987, A. Estebanez era nomeado Chefe da Divisão Jurídica da Secretaria de Estado do Trabalho do governo Moreira Franco. O poeta retornou ao ofício literário – “seu penoso ofício de sonhar” – somente naquele ano (1987) com o poema “Canto de Abrição”, que lhe deu, entre 814 candidatos, o 1º lugar no Primeiro Concurso Estadual de Poesia do Advogado Fluminense, levado a público em fevereiro do ano seguinte (1988) com o lançamento da Primeira Antologia Poética dos Advogados do Estado do Rio de Janeiro. Em seguida, aconteceu o lançamento do caderno de poesias intitulado “Canto de Abrição e Outras Sinfolias de Beira-Campo”, realizado no salão nobre da Federação Nacional dos Trabalhadores nas Industrias Urbanas (FNTIU), no Rio de Janeiro.

Em outubro de 1988 é promulgada a quinta e mais democrática Constituição do Brasil, exemplo para que os Estados Unidos aceitassem a imigração de trinta mil crianças que ficaram órfãs devido à crise do pós-Guerra do Vietnã (1989), enquanto o biografado era contemplado com uma significativa Menção Honrosa em concurso nacional de sonetos promovido pela Casa do Poeta “Lampião de Gás”, de São Paulo, em comemoração ao centenário de Guilherme de Almeida.

Nessa época, trinta mil soldados soviéticos abandonam o Afeganistão, dominado pelo regime do Talibã. Então, Estebanez começou a “falar” o “Canto de Abrição” em bares e restaurantes da região litorânea de Niterói, destacando-se o tempo recorde das quatro horas de show de poesia falada que promoveu no palco de arte do restaurante “Duerê”, em Piratininga: “(...) Mas eu atirarei minha cançãono telhado da minha casae a chuva arrastará meus versospela calhas esgotos e canaise os desaguará em mar abertocomo barcos que despertam na restinga da manhã...”

No limiar do ano de 1991, Estebanez deixou Niterói onde residia e retornou à terra natal, elegendo a bucólica cidade de Cordeiro como aquela que acreditava ser o seu mais duradouro recanto residencial, depois de sofrer a angústia financeira provocada pela ação perversa do estelionato nacional consentido que o governo Collor instituiu no país em 1990. As forças bélicas internacionais aliadas, lideradas pelos Estados Unidos, iniciam uma ofensiva militar contra o Iraque, dando início à Guerra do Golfo. Collor não pediu desculpas ao povo brasileiro vitimado pela sua armadilha verde-amarela, mas o Japão pediu perdão a milhares de mulheres coreanas que foram utilizadas como escravas sexuais durante a Segunda Guerra Mundial (1992).

Aprovado em concurso público, A. Estebanez deixou temporariamente a advocacia e passou a exercer a função de Oficial de Justiça Federal do Trabalho da 1ª Região em 1993, quando tomou posse do cargo para as jurisdições de Nova Friburgo e Cordeiro, do qual se aposentou em 1999. Parecia que seria apenas isso... Mas não era! Quando o biografado deixou Niterói, seu último instante com a literatura foi num encontro mantido com Grande Otelo e outras importantes personalidades do mundo literário mantido pela “Livraria Mônaco” no famoso “Calçadão da Poesia”, localizado no final da rua Visconde de Sepetiba em Niterói, onde foi instado a explicar que a localidade de Cordeiro era uma pequena cidade do eixo centro-norte fluminense, situada a cerca de 65 km de Nova Friburgo.

Prometera voltar a Niterói em breve. Mas durante dez anos em que viveu na cidade vizinha do município de Cantagalo, o biografado foi Secretário-Geral de Administração do Município, exerceu a advocacia, influiu na instalação da Vara do Trabalho local quando o TRT da 1ª Região era presidido pelo notável juiz-desembargador Mello Porto, foi um dos fundadores da 45ª Subseção da Ordem dos Advogados do Brasil naquela cidade (OAB/RJ), exerceu graciosamente o cargo de Assessor Jurídico Especial da Secretaria Municipal de Educação e Cultura na qual criou as leis municipais de recepção do Fundef, as de Controle Fiscal do Fundo e da Merenda Escolar no município e a de constituição do Conselho Municipal de Educação.

Naquela fase, Estebanez foi ainda nomeado Agente Cultural da Prefeitura Municipal e escreveu inúmeras “Crônicas de Itinerário” para o jornal “O Centro Norte” em que mantinha coluna cativa. Foi um dos fundadores da Associação dos Profissionais de Imprensa da Região Centro-Norte (API), reuniu esforços para recolocar em circulação os periódicos “Jornal da Região” e “Gazeta de Cordeiro” (jornal fundado pelo cordeirense João Beliene Salgado em 1889 e amordaçado pela ditadura do Estado Novo desde 1943). Fundou o jornal “Krônicon Cultural” que foi objeto de Moção de Aplausos nos anais da Câmara Municipal da cidade, serviu a vários propósitos literários, diplomaram-no jornalista laico e fizeram-no Cidadão Cordeirense, Membro Honorário das Academias Cordeirense e Itaocarense de Letras, mercê do itinerário percorrido, do qual o poeta campista Walter Siqueira, uma das maiores expressões da literatura fluminense, era o modelo mais notável. Ele testemunhou perante a Academia de Letras de Itaocara, da qual era presidente o eminente jornalista Kleber Leite, que o trabalho literário “Canto de Abrição” era, oculto na simplicidade da publicação, um dos mais belos esforços da literatura brasileira.

Em 1997, uma pequena biografia do autor foi incluída em verbete na obra “Cordeiro – A Realização das Utopias”, do conhecido historiador, escultor, poeta, jurista e escritor Alaôr Eduardo Scisínio, membro das Academias Fluminense, Niteroiense, Friburguense e Maçônica de Letras, destacando toda a obra do biografado como jornalista na região centro-norte fluminense. O livro de Alaôr foi resultado de minuciosa pesquisa sobre a história do município, baseada exclusivamente em relatos, material fotográfico e matérias jornalísticas extraídas do jornal “Gazeta de Cordeiro” publicadas desde 1889 e de outros periódicos, em cujo contexto aparece a participação do escritor, poeta e jornalista Afonso Estebanez na reconstrução da história da cidade.

Representando Cordeiro no 2º Festival de Poesia Falada de Itaocara, realizado em abril de 1992, o biografado conquistou o 2º prêmio, concorrendo com outros importantes escritores de destaque no cenário fluminense. No poema “Naquele Tempo era de Açúcar”, impregnado de lirismo irônico, o biografado fala do tempo em que “a escola era uma casa de aprendiz de amor à pátria”, numa crítica à fase em que a ditadura no Brasil introduziu “nas entrelinhas da cartilha descartável” o ensino do civismo alheio à realidade brasileira.

Mas voltando aos recentes cenários nacional e internacional, viram-se o Brasil, Portugal e outras cinco nações africanas constituindo em Brasília a Comunidade da Língua Portuguesa, viu-se a Igreja Anglicana (Inglaterra) ordenando suas primeiras pastoras reformistas, viu-se o Conselho Nacional Africano – de Nelson Mandela – vencendo as primeiras eleições multirraciais da África do Sul com larga margem de votos, viu-se o retraído e convalescente Fidel Castro visitando o Papa João Paulo II no Vaticano, e viu-se entrando em vigor o Acordo Internacional sobre Proibição de Armas Químicas, que Rússia e Cuba não quiseram assinar (1995/97).

Por outro lado, dezenove países europeus firmam o protocolo do Conselho da Europa que proíbe a clonagem de seres humanos (1998), o ex-tenente-coronel Hugo Chávez – líder de um fracassado golpe de Estado em 1992 – jura seu cargo como presidente da Venezuela, o filme “Central do Brasil”, de Walter Salles, ganha o troféu “Globo de Ouro” na categoria de melhor filme estrangeiro e, surpreendentemente, Augusto Pinochet retorna ao Chile como um homem livre, dezesseis meses depois de ter sido detido no Reino Unido por crimes cometidos contra a humanidade durante seu governo sujo e sangrento (1999).

Sobre o quê, em protesto contra o quê e em resistência a quê, fazer poesia? – indaga o biografado. De 2000 a 2004, nada mudou no espírito do revanchismo global. O que se viu foi o João Paulo II pedir perdão pelos pecados da Igreja Católica, um sangrento 11 de Setembro marcado por um belicoso atentado terrorista que derrubou as duas torres do World Trade Center em Nova York e destruiu parcialmente o prédio do Pentágono, em Washington (EUA), foi a milícia Talibã do Afeganistão explodindo a cabeça da maior estátua de Buda do mundo, foi o então presidente da Iugoslávia, Slobodan Milosevic, sendo preso sob a acusação de crimes de guerra contra a humanidade nos conflitos que envolveram a Bósnia, a Sérvia e Kosovo, e mais uma série de explosões em três estações de trem de Madrid (Espanha) que matou 199 pessoas e deixou mais de 1,4 mil feridos no mais recente 11 de março...

Em termos literários, as últimas produções da última fase (poesia contemplativa) de Afonso Estebanez (2002/2007), referem-se a estudos sobre a auto-afirmação do simbolismo místico da poesia da cultura cigana, que não sobrevive sem o culto ao amor e à paixão. “A alma cigana – explica o biografado – só morre depois do amor!”. Nesta fase, a vida amorosa de A. Estebanez parece não ter ficado ainda esclarecida, a não ser através de uma série de poemas que ressaltam a importância do “amor-paixão” como o mais recente objeto de sua obra literária, expostos em “Rapsódias de Amor Cigano (e Outras Sinfolias do Penoso Ofício de Sonhar)” como símbolo do amor fundamental, próprio das relações amorosas assentadas no amadurecimento espiritual do ser humano.

Vale ressaltar que recentemente, concorrendo com o poema “O Último Dia de Trabalho do Pôr-do-sol no Mar” e com a crônica “Trabalho como Escrevente de Pequenos Príncipes”, o poeta Afonso Estebanez venceu, em julho de 2007, nas duas categorias (prosa e verso), o Primeiro Concurso Interno de Literatura do Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região (TRT- Rio), com premiação em obras aliterárias famosas oferecidas pela Academia Brasileira de Letras (ABL).

Constituíram a comissão julgadora do concurso: Pedro Garcia, poeta, educador, doutor em Antropologia, professor da Universidade Católica de Petrópolis, Maria de Lourdes Soares, professora-adjunta de Literatura Portuguesa e Literatura da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), mestra e doutora em Letras pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ), e Vera Lúcia de Souza Lima, professora-adjunta de Literatura Brasileira da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, mestra em Letras pela PUC-Rio, doutora em Letras pela UFRJ, professora da Secretaria de Cultura do Estado Rio de Janeiro e autora de ensaios publicados na área de literatura e leitura. Presidente do TRT-1ª Região: Desembargadora Doris Castro Neves.

Finalmente, é necessário acrescentar que A. Estebanez, em toda a sua poesia construída ao longo de quase 41 anos, o que tem feito ininterruptamente é celebrar o amor encarnado em todos os elementos da alma e da natureza que constituem o símbolo nuclear do sentimento humano mais sublime, por acaso sobrevivente nos corações que clamam no deserto inapropriado ao cultivo do supremo dom do amor. Assim é que se destaca o amor nas “Rapsódias de Amor Cigano” – prenúncios e profecias da franca possibilidade de amor e justiça entre espinheiros, urzes e sarças do coração deserto..


Fonte: Site Alma de Poeta.



Menotti Del Picchia


Paulo Menotti Del Picchia nasceu em 20/03/1892, São Paulo, SP. Era filho de Luiz del Picchia e Corina del Corso del Picchia. Fez os estudos ginasiais em Campinas (SP) e diplomou-se em Ciências e Letras em Pouso Alegre (MG). Também cursou a Faculdade de Direito de São Paulo. Foi jornalista, político, romancista, contista, cronista e ensaístae advogado e agricultor.

Em Itapira (SP), dirigiu o jornal "Cidade de Itapira" e fundou o jornal político "O Grito" e escreveu os poemas "Moisés" e "Juca Mulato", ambos publicados em 1917. Passou a residir em São Paulo, onde foi redator em diversos jornais, entre os quais "A Gazeta" e o "Correio Paulistano".

Fundou o jornal "A Noite" e dirigiu, com Cassiano Ricardo, os mensários "São Paulo" e "Brasil Novo". Colaborou assiduamente no "Diário da Noite", onde, por muitos anos, manteve uma seção diária sob o pseudônimo de Hélios, seção que ele criara, em 1922, no "Correio Paulistano", através da qual divulgou as notícias do Movimento Modernista.

Com Graça Aranha, Oswald de Andrade, Mário de Andrade e outros, participou da Semana de Arte Moderna, de 11 a 18 de fevereiro de 1922. Com Cassiano Ricardo, Plínio Salgado e outros, realizou o movimento Verdamarelo; depois, com Cassiano Ricardo e Mota Filho, chefiou o movimento cultural da Bandeira.

Exerceu inúmeros cargos públicos. Foi o primeiro diretor do Departamento de Imprensa e Propaganda do Estado de São Paulo; deputado estadual em duas legislaturas; membro da Constituinte do Estado e deputado federal por São Paulo, em três legislaturas. Presidiu a Associação dos Escritores Brasileiros, seção de São Paulo.

É considerado precursor do Movimento Modernista, embora sua origem estética ainda esteja no Parnasianismo, evidente em sua poesia pela grandiloqüência e floreios verbais. Em 1982 foi proclamado Príncipe dos Poetas Brasileiros, título que pertenceu anteriormente a Olavo Bilac, Alberto de Oliveira e Olegário Mariano. Faleceu em 23 de Agosto de 1988, também em São Paulo, SP.

OBRAS:

POESIA:

Poemas do vício e da virtude (1913)
Moisés (1917);
Juca Mulato (1917)
Máscaras (1919)
A angústia de D. João (1922)
Chuva de pedra (1925)
O amor de Dulcinéia (1926)
República dos Estados Unidos do Brasil (1928)
Jesus, tragédia sacra (1958)
Poesias, seleção (1958)
O Deus sem rosto, introdução de Cassiano Ricardo (1968)

ROMANCE:

Flama e argila (1920; após a 4a ed., intitulou-se A tragédia de Zilda)
Laís (1921)
Dente de Ouro (1923)
O crime daquela noite (1924)
A república 3000 (1930; posteriormente intitulado A filha do Inca, 1949)
A tormenta (1932)
O árbitro (1958)
Kalum, o mistério do sertão (1936)
Kummunká (1938)
Salomé (1940)

CONTO, CRÔNICA E NOVELA:

O pão de Moloch (1921)
A mulher que pecou (1922)
O nariz de Cleópatra (1922)
Toda nua (s.d.)
A outra perna do Saci (1926)
O despertar de São Paulo
(Episódios dos séculos XVI e XX na Terra Bandeirante)

LITERATURA INFANTO-JUVENIL:

No país das formigas
Viagens de Pé-de-Moleque e João Peralta
Novas aventuras de Pé-de-Moleque e João Peralta

ENSAIO E MONOGRAFIA:

A crise da democracia
A crise brasileira: soluções nacionais (1935)
A revolução paulista (1932)
Pelo amor do Brasil, discursos parlamentares
O governo Júlio Prestes e o ensino primário
O Curupira e o Carão
O momento literário brasileiro
Sob o signo de Polymnia, discursos
A longa viagem, memórias, 2 vols. (1970-1972)

TEATRO:

Suprema conquista (1921)
Jesus; Máscaras
A fronteira.

OBRAS COMPLETAS:

A Noite, 10 vols.
Obras de Menotti del Picchia, Livraria Martins Editora, 14 vols.
Entardecer, antologia de prosa e verso (1978).

PIEDOSA MENTIRA


Ontem na tarde loura e de aquarela,
alguém me perguntou: "Como vai ela?
Como vai teu amor?" - Eu respondi:
" Não sei. Uma mulher passou na minha vida,
mas não lembro... " E, nessa hora comovida,
como nunca lembrava-me de ti!

E menti por pudor... A mágoa que alvoroça
nosso peito é tão santa, tão pura, tão nossa
que se esconde aos demais.
E se uma voz indaga contristada:
" Estás sofrendo?" - "Não, não tenho nada..."
E é quando a gente sofre mais...

Menotti Del Picchia

E O VENTO NÃO LEVOU MESMO!


Um tornado arrancou portas,
Matou sonhos, abalou desejos,
Revirou a casa, modificou costumes...
Levou os passos andejos.

No canto da vida, tudo quebrado,
Esfacelado no peito da agonia.
Sem conserto para tanto desmantelo,
A tristeza fazia companhia.

Mas o tornado passou!
E o vento não levou a bravura,
A coragem para reconstruir,
Reinventar passos, alar a mente,
Conquistar vida e seguir em frente.

E o que era uma casinha,
É hoje um castelo à beira da estrada,
Cheio de versos, de alegria,
Na fantasia da jornada.

Genaura Tormin

AMIZADE VIRTUAL


Configurada em bites,
Fluem as palavras,
Em códigos grafados.
Dedilhados no teclado,
Anima a tela quadrada
Do computador.

Acreditar e sorrir!
Ver o humor se agigantar.
Sentir-se feliz.
Agradecer a amizade,
E tentar retribuir,
Bordando a tela de cores,
Para multiplicar amores.

Tantas trocas afetivas,
Carinhos somados,
Tristezas divididas,
Numa mesinha solitária
No canto da sala.

Não há classe social,
Nem grife na vestimenta...
Isso não é necessário!
O que importa
É o ombro amigo,
No cultivo da felicidade,
Entre os elos da virtualidade.


Genaura Tormin

26 de mar. de 2009

MASMORRA FRIA


Abri hoje a caixa
Do meu passado!
Muitas lembranças,
Imagens guardadas,
Perpetuadas em fotografias
Já amareladas,
Envelhecidas.
Um caminho de volta!
História de uma vida!

Um filme que se rebobina
Na mente conturbada,
Rodeada de fantasmas.
São restos de alegrias
Enclausurados em celas,
De uma masmorra fria.
Arcabouços de estrutura vazia
Que fenece no tempo.
Para renascer um dia.


Genaura Tormin

24 de mar. de 2009

TENHO O CORAÇÃO EM FESTA


TENHO O CORAÇÃO EM FESTA
(Genaura Tormin)

É manhã aqui!
Um gosto de aconchego
Ainda me enlaça a cintura.
Teu rosto em mim esculpido,
Estampa-se em tudo que vejo.
O nevoeiro cobre a colina
E acaricia-me a pele,
Ainda molhada pelos teus beijos.

Envergonhado,
Nasce o sol no horizonte.
Sonolento,
Rompe brumas e escarpas,
Boceja intimidades,
Com gosto de fruta madura.

Solfeja votos de bonança,
Bordando a copa do arvoredo
De raios multicores.
Canta para me açoitar o medo,
Acalentar tantas juras,
Guardadas aqui no peito.

Há uma sinfonia no ar.
Os pássaros saltitam nos galhos.
Parecem me saudar.
Tenho o coração em festa.
É místico poder amar!

LUTO


LUTO
(Genaura Tormin)

Não há conserto
Para tanto desmantelo,
Nem oficina
Achará o defeito.

Inútil!
Nada a fazer!
Ciclo encerrado,
Porta fechada.
Tudo arqueja no tempo,
E o relógio não pára.

As mãos seguem vazias,
E por companhia,
Um passeio fúnebre
Conta a história,
Em desbotada policromia.

Foram-se os devaneios,
A lira, a fantasia,
Os versos e a canção.
Luto é o que resta.
Morto está o CORAÇÃO!

23 de mar. de 2009

UM AMIGO


UM AMIGO
(Genaura Tormin)


Um amigo é mais que um colega.
É quase um irmão.
Um amigo de verdade, é claro!
E eles são tão poucos!
Um amigo é um presente,
um relax, um confidente.
Aguça a memória,
relembra o passado,
projeta futuro,
aconselha o presente,
e é um aliado contra os perigos.

A constância de um amigo
é comprovada pelo tempo,
pela solidariedade
de cada momento
que se acumula,
enriquecendo a vida,
vencendo dificuldades,
fazendo felicidade.

Um amigo divide o lanche,
a piada, as risadas, as fofocas..
Divide as experiências,
as conquistas, as dores,
as culpas e os segredos.

Não desculpa nada,
mas perdoa tudo.
Um amigo cobra,
xinga, adverte e critica.
Mas empresta o colo,
a palavra, o sorriso,
a cumplicidade e o incentivo.

Está sempre junto na dor,
presente na alegria.
É causídico ferrenho na defesa,
embora a bronca venha depois.

Um verdadeiro amigo
não segura apenas a mão.
Enfrenta o caos, a solidão,
a depressão,
o copo vazio e a paixão.

Um amigo vibra com o sucesso,
e ampara nos fracassos,
indicando saídas, construindo caminhos.
Um amigo de verdade, é claro!